História das Ciências

A Construção do Modelo Atômico

Módulo 2

Teoria da Combustão vs. Teoria do Flogisto

George Stahl, médico e químico alemão, adotou como os três princípios elementares a água, a terra e o ar. Para a inflamabilidade, Stahl adaptou o termo grego phlogistos, usado por Becker, para flogisto.

O fogo na teoria de Stahl não constituía um elemento como na teoria aristotélica, mas uma ferramenta mecânica que ajudava a criar a mescla. Stahl fazia uma distinção bem clara entre misturas, que chamava de agregados e compostos químicos, que ele chamava de mescla s e que requeria uma reação química para ser produzido. De acordo com Stahl, o fogo agiria sobre o flogisto, tanto na teoria da corrosão, como na teoria da combustão e na da calcificação. De acordo com Stahl, quando qualquer substância combustível queimava, perdia uma porção de flogisto que fazia parte de sua constituição. A corrosão era vista por ele de modo semelhante, porém de forma mais lenta. A calcinação era um processo no qual o aquecimento de certos metais gerava o que era chamado na época de cal e que hoje denominamos óxidos. A cal era identificada com o minério e a técnica de fundir o minério com carvão envolvia a transferência do flogisto do carvão para o minério. O minério com flogisto passava a ser então o metal. O flogisto teórico era o princípio da combustibilidade e os materiais combustíveis, como o carvão, eram ricos em flogisto. A chama se extinguia quando o material havia libertado todo o flogisto que possuía.

Você pode achar essa teoria meio absurda, uma vez que você já conhece a explicação da combustão como uma reação onde o oxigênio é incorporado, porém não existe apenas uma maneira para se explicar um fenômeno, muitas vezes há mais de uma explicação possível, resta saber qual é a que melhor descreve a realidade.

A teoria do flogisto estava errada, porém funcionava e representava o que havia de mais moderno na década de 1760. Stahl raciocinou que o flogisto libertado nas queimas era absorvido pelas plantas e árvores e por isso a madeira era tão combustível. O importante é que a teoria do flogisto foi edificada a partir de um raciocínio lógico e que explicava logicamente uma série de observações empíricas. Esse fato fez com que vários químicos do século XVIII a adotassem e a defendessem.

A teoria do flogisto era puramente qualitativa e não quantitativa e foi com relação a esse aspecto que Lavoisier questionou o ponto fraco da teoria: se na calcinação ocorre perda de flogisto, como explicar então, que o produto formado pese mais que o reagente? Na época, se supunha que o flogisto tivesse um peso, porém ninguém havia conseguido pesá-lo e o aumento de peso de uma substância que havia perdido flogisto não estava de acordo com o princípio da conservação da matéria.

Conservação da Matéria
Houve algumas tentativas para exolicar o aumento do peso com a saída do flogisto. Guyton de Morveau, por exemplo, explicou o aumento de peso dos óxidos metálicos, como chamamos hoje, afirmando que o flogisto era mais leve que o ar. Outros atribuíam ao flogisto peso negativo.

Foi nessa linha que a pesquisa de Lavoisier se estabeleceu. Em 1º de novembro de 1772, ele entregou suas anotações com o seguinte título: "Sobre a causa do peso ganho por metais e diversas outras substâncias quando calcinadas" ao secretário da Academia de Ciências, onde explicava o aumento de peso pela fixação do ar durante a combustão. Sua teoria só foi apresentada a Academia em 21 de abril de 1773, mas as anotações entregues anteriormente lhe preservavam a precedência.

Lavoisier continuou realizando experimentos de calcinação até outubro de 1773, quando chegou a conclusão que alguma espécie de fluido elástico contido no ar era a substância fixada nos corpos e responsável pelo aumento de peso.

Existe na atmosfera um fluido elástico específico que se encontra misturado ao ar, e é no momento que a quantidade desse fluido contido sob a campânula se esgota que a calcinação não consegue mais ocorrer.

Esse fluido elástico só veio a ser identificado e diferenciado do ar fixo (gás carbônico) com as experiências com mercurius calcinatus na presença de carvão e na ausência de carvão. Na presença de carvão forma-se o ar fixo que já havia sido descrito por Black, Priestley e outros como o gás que extingue a chama das velas e sufoca os animais. Na ausência de carvão forma-se o fluido elástico, o ar eminentemente respirável que Lavoisier denominou posteriormente de oxigênio e que já havia sido anunciado pelo britânico Priestley como ar desflogisticado e pelo sueco Scheele como ar do fogo.

Scheele
Lavoisier tinha conhecimento dos experimentos de Priestley e de C. W. Scheele. Scheele havia isolado e descrito as propriedades do oxigênio, seu ar de fogo em 1771, porém só publicou seu Tratado sobre o Fogo e o Ar em 1777. Ele não reivindicou a precedência a que fazia jus sobre a descoberta do oxigênio. Priestley reagiu à publicação de Lavoisier, reivindicando para si a descoberta do oxigênio, mas continuou fiel à Teoria do flogisto até a sua morte, em 1804.

Em 26 de abril de 1775, Lavoisier anunciou à Academia que o princípio que se unia aos metais durante a calcinação era o próprio ar, entretanto Lavoisier também mencionou que o novo gás era mais puro e respirável que o ar da atmosfera. Sua palestra foi publicada no mês seguinte com o título: "Sobre a natureza do princípio que se combina com metais durante calcinações e aumenta seu peso".

Veja aqui a comparação entre dois exemplos de reações conforme essas teorias.

Na concepção de Priestley, o ar não era um elemento indestrutível e inalterável, mas uma composição. Foi provavelmente ao tomar conhecimento das experiências de Priestley que Lavoisier entre 1776 e 1777 descobriu a verdadeira composição da atmosfera. Ele chamava o oxigênio de ar desflogisticado de M . Priestley, porém foi na memória de 5 de setembro de 1777 que ele designou o ar eminentemente respirável no estado de fixidez ou combinação de princípio acidificante ou ainda, o mesmo significado com um nome grego - princípio oxygine.

Na memória de 25 de novembro de 1780, Lavoisier empregou a expressão ar vital para o ar desflogisticado de Priestley. Para Lavoisier, o oxigênio seria a combinação do princípio oxigênio e a hipotética matéria do fogo e do calor denominada calórico. Na calcinação, o calórico se perde e o princípio oxigênio é incorporado pelo metal, formando a cal. Várias dessas cais eram ácidas e decorre dessa observação a idéia de Lavoisier que todos os ácidos seriam substâncias oxigenadas.

As idéias de Lavoisier se baseavam sempre em medidas ponderais e volumétricas muito precisas, as mais precisas que os melhores aparelhos da época permitiam. Seu método consistia em fazer experiências e estabelecer experimentalmente a prova contrária. Por exemplo, Lavoisier realizou experiências de síntese e de decomposição da água. Em 24 de junho de 1783, através da síntese, provou que a água não era elementar e sim constituída de dois princípios, sendo um deles o princípio oxigênio. No dia seguinte Lavoisier e Laplace comunicaram a academia:"A água não é uma substância simples, ela está composta peso por peso, de ar inflamável e de ar vital" . É interessante observar que outros cientistas da época já haviam sintetizado a água, porém explicaram a síntese em termos da Teoria do flogisto, como foi o caso de Henry Cavendish. Em 1784, Lavoisier e Meusnier foram indicados pela Academia para aperfeiçoar os aeróstatos (balões de ar quente ou de hidrogênio). Eles fizeram pesquisas sobre métodos de produção de hidrogênio em grandes quantidades e tentaram obtê-lo pela decomposição da água. Utilizaram para esse fim um cano de fuzil de ferro levado a incandescência. A água escorria gota a gota pelo cano se decompondo em hidrogênio e oxigênio. O hidrogênio era recolhido enquanto o oxigênio reagia com o ferro, oxidando-o.

Ascensão de Pilâtre de Rozier e do Marquês d'Arlandes num balão de ar quente em 21 de novembro de 1783 Durante o período de 27 de fevereiro a 12 de março de 1785, Lavoisier, juntamente com Meusnier, realizou a decomposição e a síntese da água. Os volumes dos gases empregados foram medidos com muita precisão na presença de um grande número de convidados. Combatendo a teoria do flogisto, Lavoisier também demonstrou que aquilo que se pensava ser elemento (ar e água), desde Aristóteles, era de fato composto.


Prancha IV do Tratado Elementar de Química de Lavoisier. Os desenhos foram feitos pela Senhora Lavoisier. A Figura 5 corresponde a aparelhagem utilizada para sintetizar a água e a Figura 2 ao aparelho utilizado por Lavoisier para o estudo do oxigênio.

Para saber mais

Acesse o artigo "A revolução Química de Lavoisier: uma verdadeira revolução?", publicado na revista Química Nova 18(2), 1995 do professor Filgueiras no endereço quimicanova.sbq.org.br. Outro artigo muito interessante e detalhado sobre a obra de Lavoisier se encontra no famoso artigo Lavoisier: Uma revolução na química, de Lúcia Tosi, publicado na revista Química Nova 12(1), 1989, pode ser encontrado neste local, também no endereço quimicanova.sbq.org.br. Um livro muito interessante para o trabalho com o ensino médio, inclusive por permitir uma Interseção com a disciplinas de História é o paradidático Lavoisier e a Ciência no Iluminismo do grupo Teknê, editora Atual.